sábado, setembro 27, 2008

Conversa ensaiada

Tem hora que a gente abaixa a guarda e se permite ser feliz com infimidades. Como aquele filme por qual você é louco acabando de começar bem no meio da sua insônia às 3 da manhã, filme que você até ia comprar se não tivesse plena consciência de que tê-lo guardado tão perto e disponível ia ser motivo suficiente pra nunca mais assisti-lo. Esse é de fato o mesmo princípio de alguns relacionamentos, o famoso "o segredo é não correr atrás". Tudo que está ao alcance das mãos acaba sendo postergado. A hora que você quiser ele vai estar lá na estante, solícito, o aguardando com o mesmo sorriso de dois anos atrás. Então vamos atrás do que pode sair voando, do que é raro, indisponível de forma regular. A lua, tem dia que nem se sabe pra que lado ela está, mas todo mundo se mobiliza pra assistir aquele eclipse completo que "só vai acontecer outro daqui a cento e sessenta e dois anos". "Mais vale um na mão do que dois voando"? Você guarda o que tá na mão e vai atrás dos que estão voando! Na sociedade do "quem não arrisca não petisca" todo mundo quer saber de petiscar. Ainda mais ao se deparar com duras realidades dos adeptos do conformismo que nos cercam de banalidades e vivem remoendo problemas. Vivem contando dinheiro e não mudam quando é lua cheia. Tá bom, cante o blues da piedade pra eles.

Acho que a gente vai recheando nosso rol de interesses com peculiaridades para se ter uma dose instantânea de cumplicidade ao nos depararmos com alguém que compartilhe da mesma loucura. Afinal, as chances de você encontrar alguém que irá te fazer feliz a vida toda são tão remotas quanto encontrar alguém que ao mesmo tempo adore fazer ioga, seja louco por filme francês de segunda e tenha como prato predileto beringela recheada. Você até abre mão do gosto pela beringela recheada, por que a essa altura você acha que é o único que gosta desse troço, porque nem no orkut você encontrou comunidade dessa iguaria. Pensou até em criar uma, mas vislumbrou teus amigos mandando recados: "Ai que nojo, você come beringela recheada?" e pôs em cheque seu gosto culinário. Há uma corrente que defende que essa busca incessante de prazeres multifacetados se dá pela atual incapacidade de mantermos longas e efusivas conversas sobre o bem estar alheio. O "como vai você" hoje em dia está agregado ao "alô". Tem vezes que parece que estou ao telefone com algum ator iniciante lendo um script antes de começar a falar o que quer: "Alô? Aqui é fulano, como vai? Olha..." - digo que parecem atores iniciantes porque se no meio da leitura do "script" você responder "tô meio gripado, dormi mal ontem à noite" você sente uma interrogação do outro lado da linha, só falta ele falar "peraí, onde tá escrito isso?".
Teve uma vez que me ligaram:
-Alô? Como vai você?...
-...Eu preciso saber da sua vida. Peça a alguém pra me contar sobre o seu diaaaa...
-Marlon?
-Não filho, é o Rei Roberto Carlos.